domingo, 22 de abril de 2012

Entre sonhos e realidades



E se viu andando. Andava, e não sabia aonde ia. Só sentia uma vontade de andar, de caminhar para frente, para ver se a dor passava. Mas não lembrava que dor sentia . Só sabia que tinha que caminhar, para tirar uma dúvida que naquele momento não lembrava bem qual seria.

E passeava por campos, ora belos, ora temíveis. Cheiro de rosas sentia às vezes, mas, em outro, um forte sabor seco e quente transpassou sua língua, ferindo seu paladar. Realmente não sabia onde estava.

Até que encontrou a casa. Não era tão grande quanto imaginava, nem tão bonita, nem tão elegante. Mas era sincera, era simples e bonita. Tinha uma porta e algumas janelas, com uma chaminé que liberava uma fumaça clara de seu topo. Era um cenário muito bonito, e que o deixara, por alguns instantes, inebriado.

- Entre, pode entrar!

Gritou uma voz de dentro da casa. Assustou-se um pouco, mas foi atendendo ao chamado.
Abriu a porta, e dentro era como imaginava, uma casinha dessas camponesas: de materiais simples, mas muito fortes, que aparentavam uma resistência eterna. Passou por uma sala, onde existiam apenas duas cadeiras, uma virada para a outra, que pensou se tratar de uma sala de aconselhamentos. Entrou mais um pouco e deparou-se com a cozinha, onde um pobre velho preparava um chá de ervas do campo com água que fervia em uma chaleira sobre um fogo que brilhava muito, exalando aquela fumaça que vira em cima da casa.

- Olá meu garoto, seja bem vindo! Disse o pobre velho.

- Onde estou? Onde é aqui? Perguntou o assustado rapaz.

- Como assim, vem me visitar e não sabes onde está?

- Como sabes que vim te visitar?

- E o que fazes aqui?

- Desculpe, deve ter sido um engano. E fez como se saísse, voltando.

- Vá em paz meu garoto, e venha sempre que precisar!

- Do que estou precisando?

- Não deve ser eu quem o saiba, mas você. Faça um esforço e tente sentir o que lhe trouxera aqui.

E uma grande dor atravessou seu corpo. Suas pernas falharam, caiu no chão chorando copiosamente.

- Não chore meu bom rapaz, ela está bem.

- Por que estou chorando, pobre velho?

- Porque está sofrendo muito com a partida de sua mãe.

- Para onde ela foi?

- Ela encerrou sua vida, tendo a felicidade de ter vivido muitos anos em uma família maravilhosa.

- Oh não, é mesmo! Minha pobre mãe! Como Deus pode ter feito isso comigo!

- Você acha que ela estaria mais feliz agora viva com você e seus irmãos?

- Sim, é claro! Como vamos poder continuar nossas vidas sem ela! Que dor, que dor!

- Não chores mais meu bom garoto, ela ficará triste por você estar sofrendo tanto.

- Como ela irá sofrer se não vive mais!

- Enganado está, pois ela vive sim. Então pensas que ela já não existia antes de viver?

- De onde ela veio antes de nascer meu pobre velho?

- Ela veio de onde ela foi agora, do mundo fora da matéria. Meu bom garoto, assim como existe a matéria, assim também existe o mundo sem matéria.

- E como pode isso?

- Quantas perguntas, quantas perguntas... Aceita um pouco de chá?

- Sim, por favor... hmm, está uma delícia!

- Sim, é verdade. É de uma ótima safra que estou colhendo, de reinos um pouco distantes do seu.

- É realmente muito bom esse chá pobre velho. Você deve amar muito seus produtores. Já me sinto melhor...

- Sim, eu os amo muito. Mas amo também aqueles que não produzem boas safras, como aqueles que criticam o ceifador por tirar-lhes seus bons frutos.

- Como assim?

- Meu garoto, há a vida e há a morte. Você mesmo, que um dia nasceu, um dia irá morrer. Assim como sua mãe.

- Oh, não me lembre disso! Minha mãe morreu! Quanta dor, quanta dor!

- Tome mais um pouco desse chá meu bom garoto.

- Nossa, minha dor passou pobre velho! Não sei como lhe agradecer!

- Podes me agradecer se for em paz, se aceitar a resposta que tenho para tua pergunta.

- Ah sim, eu tinha uma pergunta importante para fazer. Era saber por que Deus está fazendo eu e minha família passarmos por tudo isso.

- Meu filho, eu não posso lhe dar essa resposta. Pois ela é sua. Você deve perguntar a si mesmo.

- Se você é Deus, então por que mora em uma pequena casinha, é velho e sozinho?

- Quem disse que esta é uma pequena casa, que sou velho ou que vivo sozinho? Saiba, meu bom garoto, que esta imagem que está vendo é formada por você mesmo... Você não pode ver a Deus. Deus é constituído da mais nobre matéria. Ele está em todos, mas todos não estão nele. Este que você vê não passa de um fruto de sua própria imaginação. Mas respondendo a sua indagação, saiba que este tamanho é perfeito para mim, que não preciso de muitas coisas. Sou velho sim, mas possuo muita saúde, vivendo ainda hoje e para sempre na flor de minha juventude. E quanto a estar só, não estais aqui a vir me visitar?

- Me desculpe pobre velho, você está certo. Lembro agora que antes de dormir rezei pra ti para que me dissesse o porquê de ter levado minha mãe... Sabe, ainda não entendo, e a dor por vezes volta, mas estou contente, pois sei que assim como você me deu esse chá maravilhoso e me curou, assim também irá curá-la, e ela voltará a viver.

- Sim meu bom garoto, não se preocupe, pois a natureza é perfeita.

- Muito obrigado meu pobre velho!

- Vá em paz meu garoto, espero ter respondido a sua dúvida...

E acordou em sua casa. Estranhamente aliviado, apesar de tudo que passou com a partida de sua mãe.

Não lembrou o que pedira antes de dormir, nem de seus sonhos... Mas sabia que estava bem, e que agora precisava de forças para ajudar sua família. Disse pra si mesmo que ela partira, mas ia ficar bem. Ele precisava voltar para sua vida agora.

E assim agradeceu a Deus pela graça de acordar e dormir todos os dias!